Cronologia- 19 de Maio de 75







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11.40 - É entregue na redacção um comunicado dos emitido pela CCT dizendo que "A Comissão Coordenadora dos Trabalhadores do jornal "República" comunica que de acordo com o estabelecido na Reunião geral dos Trabalhadores (RGT) de 2 de Maio...suspende do exercíco das suas funções a Direcção e Chefia de Redacção do mesmo jornal, elegendo como Director Interino o camarada Alvaro Belo Marques"

15.00 - a tiragem do jornal sai a hora normal e não muito diferente das outras edições. Na primeira página vem um editorial de "Estimado Leitor"

18.00 - inicio da concentração em frente ás instalações do jornal organizada por uma "Comissão de Leitores da República", Mario Soares e Salgado Zenha organizam a manifestação.

19.30 - oficiais do COPCON e da PM entram nas instalações da "República". Seguem-se forças destas unidades, que vão manter a segurança interna do edifício, que, entretanto se encontra guardado no exterior por enorme aparato militar e policial.

20.00 - João Gomes assoma à janela do Gabinete da direcção e fala à multidão que se acotovela na Rua da Misericórdia: "Nós garantimo-vos que não sairemos daqui. A luta continuará até à nossa vitória. Os leitores da "República" terão o seu jornal autêntico". (Aplausos e palavra de ordem partem da rua: "Rego amigo, o povo está contigo").

20.15 - é Alvaro Guerra quem vai à mesma janela dar explicações à multidão impaciente. Diz: "Qualquer que seja a solução que este caso tiver ela terá de ser aprovada e apoiada por vocês todos que são verdadeiros leitores da "República" (Aplausos).

20.25 - João Gomes relata a um graduado do COPCON a sua versão dos acontecimentos da manhã em que causa a CCT da haver posto a direcção do jornal perante uma situação de "facto político".

20.30 - a agitação da multidão recrudesce. É Mário Soares que chega à "República" acompanhado de Sottomayor Cardia, Manuel Alegre e outros elementos da cúpula do PS. A multidão rompe em largos aplausos e pede para abrir alas. O secretário geral do PS atinge a entrada principal da "República" e grita-se para cima que "abram a porta" (não abrem)

20.35 - na sala de redacção as pessoas agitam-se quando se apercebem da presença de Mário Soares lá em baixo. Uma empregada da administração conta a um sargento dos "Comandos" que mário Soares estava a tentar penetrar nas instalações e que os trabalhadores não admitiram tal. Comentário do sargento: "Fique descansada que aqui não entra". Alberto Arons de Carvalho, ao lado, retorquiu: "Olhe que tem acções cá na casa". O sargento outra vez: "E mesmo que tenha..."

20.40 - na redacção, um tipógrafo comenta jocosamente: "Não me digam que lá fora está o povo. Quem ali está é o PS e os seus interesses neste jornal".

20.45 - uma pedra estilhaça uma das vidraças da janela da publicidade (enquanto a multidão entoa: "Morte à CIA e ao KGB" - apropriação da palavra de ordem do MRPP)

20.50 - na rua canta-se o Hino Nacional. Vítor Direito, à janela, acompanha.

21.00 - cinco "Chaimites" vêm reforçar as forças que guardam o edifício. Os manifestantes reagem: "MFA de que lado estás?"

21.05 - novo projéctil parte o vidro. Desta feita era uma lanterna portátil...

21.10 - na presença de Mário Soares ecoam diversas palavras de ordem. Registei algumas que me chegam com mais clareza: "Os soldados são filhos do povo", "Nem Carlucci, nem Cunhal, independência nacional", "Ninguém arreda pé", "Fora da "República" os sociais-fascistas". (Algumas destas palavras de ordem são habituais do MRPP)

21.30 - Mário Soares realiza um comício. Munido de megafone o secretário-geral do PS, que haviam incitado antes a "Socialismo, sim! Ditadura, não!" afirma que a "Republica" "é uma voz independente que terá de continuar como sempre foi". Adiantaria também que "estamos aqui como patriotas a defender a liberdade de expressão pois não toleramos que uma escassa minoria de pessoas calem aquela que é porventura das poucas vozes livres que ainda existem neste país". (A multidão aplaude e canta de novo "A Portuguesa").

22.00 - Mário Soares, precedido do major Lobato Faria, dos "Comandos", tenta entrar nas dependências do jornal através da porta das oficinas. Os trabalhadores não consentem. Gera-se conflito entre as duas partes. Da porta, Mário Soares pronuncia: "Vocês estão a fazer objectivamente o jogo da reacção". Referia-se aos trabalhadores dirigidos pela CCT. Retorquiram alguns elementos: "Isto aqui não é a sede do PS. Tu e o teu colega Cunhal devem pôr os olhos na força dos trabalhadores. Não hão de continuar a brincar com o Povo. Vão os dois para onde estavam". (Palmas - enquanto o secretário geral do PS se retirava)

22.20 - a TV, que tinha conseguido "meter" uma equipa de reportagem dentro das instalações, já havia conseguido enviar para os estúdios um filme. A esta hora queria regressar à base. Todavia a multidão, cá fora, não lhe consente.

22.45 - o Telejornal é aguardado com ansiedade numa das salas do jornal. Quando vai para o ar detecta-se a imagem de um trabalhador (Vladimiro) a historiar a luta que haviam desencadeado. Segue-se Raul Rego a narrar promenores que redundavam na saída da "República", nessa tarde, que ficou conhecida como a edição "Belo Marques".

23.00 - na via pública a manifestação "aquece" enquanto a chuva continua a cair. Uma rajada de "G-3" alarma o cento e tal de pessoas que se encontram fechadas nas instalações do jornal. Alguns dos manifestantes correm desenfreadamente. Há quem se estatele. E que fique "atropelado" na confusão que se gera. Os dois tiros foram para o ar...

23.15 - voltam as palavras de ordem. Registo: "Quer roubar mais um jornal o partido do Cunhal", "Não deixaremos que o Cunhal assassine o jornal", etc.

23.30 - o major Lobato Faria dirige-se a uma das janelas de sacada. Não tem oportunidade de abrir a boca. Ouve: "De que lado está o MFA?" (retira-se sobre as vaias da multidão).

23.35 - o mesmo oficial do regimento de "Comandos" unidade afecta ao COPCON, entra no gabinete de Raul Rêgo, demora-se alguns minutos em conferência com elementos da cúpula do vespertino e quando sai traz na mão direita uma folha de papel que se sabe de seguida ser o pedido expresso da Administração para selar as portas do edificio se o litígio não se solucionar. Considerava-se que o jornal havia saido nesse dia ilegalmente.

23.40 - o espectro do selo causa apreensão em vários trabalhadores a quem oiço pela primeira vez que seria aconselhável voltar ás negociações.

23.45 - um telegrama é lido através do megafone por um dos manifestantes. Dizia: "Leitores da "República" protestam indignados face à escalada desavergonhada que visa silenciar a voz independente da Imprensa portuguesa".

23.50 - grita-se na rua contra os militares: "Assassinos, assassinos".



Dia seguinte

Retirado de "O Caso República, documentos, entrevistas e comentários"




O Caso República
1997 - Lisboa, Portugal

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Trabalho realizado por:
Pedro Miguel Guinote
Rui Miguel Faias
Mário Rui Nicolau


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