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Caso República
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As hostilidades que, desde 2 de Maio, opunham os
trabalhadores gráficos e dos serviços administrativos, representados pela Comissão
Coordenadora de Trabalhadores (CCT), e a redacção e administração, atingem o seu ponto
mais crítico no dia 19 de Maio de 1975.
Na manhã desse dia, a CCT decide "suspender do exercício das suas
funções" a Administração e a chefia de Redacção acusando-as de estarem a tentar
transformar o jornal num órgão afecto ao Partido Socialista. As instalações do jornal
são ocupadas pelos trabalhadores que comunicam aos jornalistas que quem quiser sair já
não poderá voltar. Ninguém sai. A edição de 19 de Maio do "República" sai
para a rua à hora prevista mas com uma constituição diferente: lia-se no cabeçalho o
nome de Álvaro Belo Marques como director-interino e um editorial "Estimado leitor" explica a razão da luta dos trabalhadores.
Como reacção, a redacção do jornal lança também um comunicado
insurgindo-se contra o abuso de poder de "uma Comissão dos Trabalhadores".
No exterior das instalações, o PS organiza uma manifestação
de apoio à antiga direcção. Mário Soares, Salgado Zenha, Manuel Alegre, Sottomayor
Cardia são algumas das personalidades que lideram o ajuntamento popular no Largo da
Misericórdia.
Com o decorrer das horas, o número de manifestantes aumenta. Entoam-se hinos e
proferem-se palavras de ordem contra os "ocupantes" do edifício, contra o PCP,
contra Álvaro Cunhal e contra o MFA. A tensão aumenta à medida que a concentração tem
mais adesão. Às 19.30, oficiais do COPCON e da PM entram no edifício da
"República" para protegerem quem lá se encontra e evitar uma escalada da
violência.
O governo age, nessa mesma noite, enviando o ministro da Comunicação Social, Correia
Jesuíno, às instalações do "República", numa tentativa de conciliação
entre as partes envolvidas. Não escondendo um certo afastamento em relação à crise
("Antes de mais desejo tornar bem claro que a Editorial República é uma
empresa privada que publica um jornal que respeito muito" (...)
"esclareço desde já que o conflito entre trabalhadores e Administração foge ao
âmbito do meu Ministério"...) afirma no entanto que "existe uma Lei de Imprensa que deve ser aplicada. E ela dá razão completa
à administração desta empresa. Que tem todo o direito a meu ver de fazer o jornal como
entender" .
Às seis da manhã do dia vinte, depois de fracassadas as negociações e dada a
intransigencia dos trabalhadores, o ministro, resolve direccionar o caso para os
tribunais, e manda selar as instalações do "República", sob fortes protestos
da multidão que o acusa de "fazer o jogo do Cunhal".
No Comunicado, emitido no mesmo dia, o Ministério da
Comunicação Social expõe as razões da decisão.
O jornal permanece fechado até 18 de Junho. As exigências dos trabalhadores
relativas ao pagamento dos salários dos dias em que o jornal se encontrava encerrado, à
manutenção de Álvaro Belo Marques na equipa do "República" e à
participação de todos na orientação política do jornal, não encontra qualquer eco
junto da antiga direcção. No dia 18, o COPCON, cedendo às pressões da CCT decide, à
revelia do Conselho da Revolução, reabrir as portas do "República". O jornal,
constituído maioritariamente por elementos oriundos das forças armadas e da esquerda
mais radical, reaparece nas bancas no dia 10 de Julho apresentando como director o Coronel
Jorge Pereira de Carvalho.
Na sequência desta atitude, o PS abandona o governo, acompanhado pouco tempo depois
pelo PPD / PSD, provocando a queda do IV Governo provisório no dia 17 de Julho de 1975.
No dia 25 de Agosto, é lançado um novo jornal, "A Luta", ligado ao PS,
constituído essencialmente por redactores saídos do "República" aquando da
crise.
Com a tentativa fracassada de golpe militar no dia 25 de Novembro, a "legitimidade
revolucionária" defendida pelo PCP acaba definitivamente.
A 26 de Janeiro, o Conselho da Revolução decide entregar o "República"
aos "legítimos proprietários" e manda que a direcção e redacção do jornal
em exercício reintegre as forças armadas.
O "República" nunca mais voltou a ser publicado...
No plano internacional, este caso foi amplamente discutido pela maior parte dos
grandes jornais europeus. A questão não era, no entanto, a de saber se os trabalhadores
tinham ou não tinham razão. O episódio do "República" foi visto, no
exterior, como um caso de ocupação de um jornal socialista por parte dos comunistas,
com o perigoso consentimento dos militares. A maioria dos orgãos de comunicação
social estrangeiros apoiaram a tese socialista: o PCP dominava
quase totalmente os meios de comunicação social em Portugal, o "República"
era a "última esperança" de se poder assistir à tão desejada liberdade de
expressão.
O diário francês Le Monde foi dos poucos que não alimentaram esta tese. Segundo
este jornal, a revolta dos gráficos do "Republica" teria sido transformada pelo
PS num atentado à liberdade de imprensa, com o objectivo de virar o povo contra o PCP e
contra o MFA. Com efeito, segundo o matutino francês o PCP não controlava os
trabalhadores do "República", como o PS queria fazer crer, visto que, depois da
tentativa de golpe de Estado do 11 de Março, muitos trabalhadores do
"República" afectos ao Partido Comunista tinham ido para outros jornais
nacionais e no "República" tinham ficado sobretudo elementos de outros partidos
de esquerda e de extrema esquerda.
Na opinião de José Rebelo, jornalista, correspondente do
"Le Monde" em Portugal de 1975 a 1991 e testemunha ocular da concentração de
19 de Maio, o Comunicado tardio do PCP, de 22 de Maio de 75, é
revelador do contexto na medida em que não refere directamente os acontecimentos do Largo
da Misericórdia, e prefere tentar levar o debate para o campo político acusando o PS de
quebrar o pacto MFA - Partidos celebrado no dia 13 de Abril de 1975.
É sempre difícil saber de que lado está a verdade. Com efeito, em consequência das
nacionalizações de 1975, especialmente dos bancos, grande número de jornais portugueses
ficaram sob a influência de entidades ligadas ao PCP o que foi sentido em todos os meios
de comunicação social como uma ameaça à liberdade de imprensa. A questão do jornal
"República", mesmo que não tenha sido um caso de hegemonia do PCP tornou-se,
pela actuação do partido socialista numa bandeira para acabar de vez com a "ameaça
comunista".
O Caso República
1997 - Lisboa, Portugal
Comentários para o webmaster
Trabalho realizado por:
Pedro Miguel Guinote
Rui Miguel Faias
Mário Rui Nicolau
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